sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

O pecado

Ao longo da minha vida, não tão longa assim, pude presenciar três diferentes momentos, em que o conceito de pecado me atingiu de maneira diferente. No primeiro momento confesso que não era capaz de definir o que era ou não era considerado pecado, mas a cultura cristã, predominantemente católica em minha casa e no Brasil, me ensinava que o pecado estava certamente ligado a desvios de conduta. Era a noção que eu tinha.
Em seguida, eu jovem, com o advento do movimento que difundiu as igrejas evangélicas, o pecado, em um primeiro momento, era visto em lugares e atitudes os quais eu não compreendia, e eram muitos lugares. A palavra “crente” estava associada a pessoas de vestimentas características, como mulheres de longas saias e cabelos grandes, e restrições no modo de viver. Fiquei confuso. Mas na continuidade deste processo, os evangélicos assumiram outras vertentes, e flexibilidades, cresceram e se espalharam, e a palavra crente passou a ser associada simplesmente a um homem e mulher de Deus. O pecado seria, então, aquilo que não era conveniente a um homem, ou mulher, de Deus.
Começamos então a falar de globalização, interatividade, liberdade de expressão, e o mundo conceitual se transformou rapidamente, assim como a noção de pecado. O certo e o errado também foram tomados por um nevoeiro denso e cuja fumaça de tantas informações, opiniões, e o respeito as diversidades, que não permite a um jovem, por exemplo, discernir claramente um do outro. O importante é ser feliz, e o que é certo passou a ser aquilo que eu quero, tirando roubar e matar, e ficar pelado no meio da rua (por enquanto).  Vivemos dentro da nova cultura, do individuo no centro do universo.
Cabe então revisitar o conceito de pecado, que está associado diretamente ao coletivo, e não ao individual. O homem foi criado por Deus para viver em sociedade, para ser feliz, mas sabedor que a felicidade está nos relacionamentos, buscou ditar regras que permitissem a convivência mutua, e não é a toa que toda a lei e os profetas, como se referia os judeus em relação as antigas escrituras, foi resumida por Jesus em amar a Deus sobre todas as coisas, e amar ao próximo, como a si mesmo. E complementou com um mandamento novo, “amai uns aos outros, como eu vos amei”, ou seja, um amor ainda maior, pleno.  A lei, então, não deveria ser mudada, mas cumprida. A lei pretendia motivar o bem estar dos relacionamentos entre nós.  Jesus chamava de hipocrisia o desdobramento de regras que foram criadas pelos homens, e que serviam apenas para nos manter  aprisionados na sensação de erro, mas não resguardavam a vontade única de seu pai, que era a de vivermos todos em comunhão, caminho este que nos traria felicidade plena.
Logo, o pecado, aquilo que nos distancia de Deus, está ligado a duas coisas básicas. Ferir o nosso amor por Deus, com a desobediência consciente, e ferir o nosso amor pelo próximo, gerando desamor. E é bastante importante atentarmos para isto.  O pecado existe, e traz a infelicidade para o mundo, logo qualquer cristão deve combatê-lo.
Para que se cometa um pecado, é preciso antes de tudo, uma decisão. Quando temos consciência de que algo é errado, e mesmo assim, tomamos a decisão de seguir em frente, desobedecendo a nossa própria consciência, e desobedecendo a Deus. E o que é desobedecer a Deus?. Aí está o link com a segunda condição, quase formando uma única: Gerar desamor.
O desamor está de fato na face oposta a essência de Deus, que é amor. E o desamor está hoje muito presente em nossa sociedade.  Quando pensamos de maneira egoísta, ou mesmo apenas individualista, deixamos de enxergar de que maneira aquilo vai refletir na vida do outro, quando vivemos na verdade, em comunidade. O pecado está então configurado na conseqüência de nossa atitude, quando gera desamor. Podemos assim facilmente avaliar o que é, ou não pecado, verificando se aquilo gera ou não, desamor.
A noção que eu tinha naquela primeira fase da minha vida, onde o pecado estava associado a desvios de conduta, ou na segunda, quando parecia  ligado a regras comportamentais, e posteriormente ao que era conveniente ou não para um homem ou mulher de Deus, agora estava mais claro, pois compreende tudo aquilo, mas com uma justificativa: Somos instrumentos de Deus para fazer a sua vontade na terra, que é gerar amor, e não desamor
Omissão diante do sofrimento do próximo também gera desamor, quando nos tornamos cúmplices dele. Certa vez havia em frente ao meu prédio um homem sofrido, bêbado,  pedindo ajuda, ao mesmo tempo incomodando, e ninguém fazia nada. Ele sentava-se na calçada, encostado a um muro, e eu saia, olhando aquela cena, sentindo vontade de fazer  algo, mas nem sabia ao certo o que, e logo já distante, apenas lamentava, e seguia para minhas responsabilidades.  Certo dia, pedi que servissem algo para ele, mas era algo paliativo, e aquela visão continuava me incomodando, cobrando algo de mim. Até que pensei em enfrentar a situação e ir falar com ele, saber mais de que maneira eu poderia, de fato, ajudá-lo. Ele havia desaparecido. Parece que a policia o havia levado. Foi como um tapa na minha cara, um sinal. Muitas outras vezes vivi situações semelhantes, como em Roma, na porta de um restaurante em uma noite muito fria. O velho sentado ao chão perto da entrada tocou meu coração, mas nada fiz. Já durante o jantar senti vontade de voltar lá e ajudá-lo, mas ele havia sumido. Ainda andei pelas proximidades, mas nada dele.  Isso me lembrou Jesus em (    ) quando Ele disse: “todas as vezes que não fizestes isto por um destes pequeninos, não o fizeste a mim”. Fui pecador cúmplice do sofrimento que poderia ter amenizado, consciente do que não fiz.
O pecado mancha a nossa alma, e é gerado na intenção, por isso o que é pecado para uns pode não ser para outro, assim como o que não é para você, pode ser para o outro, logo não devemos levar ao outro a pecar, simplesmente porque pensamos diferente. Se conduzimos alguém a fazer algo que ele julga errado, induzimos o pecado. Podemos sim, como é o propósito deste texto, fazê-lo rever alguns conceitos de pecado, e aí sim,  livres da culpa, avaliarem a conseqüência do ato, se promove amor, desamor ou é indiferente.
Livres da escravidão do pecado, que Jesus nos ofereceu por meio do arrependimento sincero, sejamos mensageiros do amor de Deus, conscientes de nossas atitudes, promovendo o que é bom, evitando julgar o que não conhecemos, ou criticar sem conhecimento de causa o próximo, sendo misericordiosos para entender as limitações dos outros, evitando o que possa prejudicar alguém, agindo diante da infelicidade do irmão, rindo com os que riem, chorando com os que choram, como já dizia o apostolo Paulo.  Ou seja, sejamos simplesmente, cristãos.
Graças para todos

Um comentário:

  1. parabéns!!! seria bom um dia parar um pouco para conversar sobre coisas espirituais com você... percebo um pensamento e uma interpretação de "religiosidade" diferente em você. Isso é bom!!!

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