sábado, 26 de outubro de 2013

A IGREJA INCLUSIVA - UMA REFLEXÃO


A IGREJA INCLUSIVA – REFLEXÃO

Em alguns momentos de minha vida, surpreendo-me com situações inusitadas, como nesta manhã. Mesmo sendo um assunto muito delicado, preciso partilhar as reflexões que me vieram, pela maneira que vieram.

Na noite anterior, deitado, terminava de ler a revista Época quando me deparei com a matéria – “É possível ser gay e cristão?”. Tratava das chamadas igrejas inclusivas, criadas por pastores americanos, na afirmação de que Deus tem amor incondicional por todos, incluso homossexuais, travestis e transgeneros.

É um tema explosivo, pois a Bíblia em algumas passagens reprova o homossexual, o que motiva padres e pastores a esta mesma reprovação. Na matéria, diz ser fundamento desta corrente, uma releitura desta reprovação, por sua vez contestada por teólogos tradicionais. Desta releitura, cita como exemplo os motivos da destruição de Sodoma e Gomorra, onde os tradicionais apontam a passagem do livro de Judas que diz: “De modo semelhante a estes, Sodoma e Gomorra e as cidades ao seu redor se entregaram a imoralidade e as relações sexuais antinaturais. Estando sob o castigo do fogo eterno, eles servem de exemplo”. Por sua vez, os inclusivos propõem que o verdadeiro motivo não foi este, mas “Eis que foi a iniquidade de Sodoma, fartura de pão e prospera ociosidade teve ela e suas filhas, mas nunca amparou o pobre e o necessitado”. (Ez 16:49)

O texto segue com personalidades do meio comentando, com certa ironia, a interpretação. Lá, diz o escritor Richard Foster, com razão diz: “A homossexualidade é um problema tão difícil de tratar dentro da comunidade cristã que tudo o que for dito será severamente criticado”. Logo, não é fácil para mim escrever estas linhas. Mas não sei porque, acredito que Deus está em minha vida, talvez querendo me usar, e sopra seus propósitos, nas minhas “coincidências”. A mensagem final da reportagem deixa no ar a questão de existir um rebanho de homossexuais que se entendem cristãos em busca de um caminho. Mas que apesar de estarem se organizando em igrejas próprias, gostariam na verdade de serem aceitos como qualquer cristão, amado por Deus em sua condição.

Refleti pouco, e adormeci. Cedo, acordei. Queria andar na praia, fiz minhas orações, olhei minha esposa ao lado e resolvi espera-la. Finalmente me senti cobrado, ao ver a Bíblia na cabeceira, da leitura que costumava fazer, e há um bom tempo não o fazia, em face das últimas viagens, trabalho frenético e falta de disciplina. Abri aleatoriamente, em uma passagem que tratava da profecia onde Nabucodonosor destruiria o Egito e terras vizinhas em chamado de Deus contra a soberba destes povos. Abri novamente, da mesma maneira, em uma passagem intitulada: “A meretriz e as abominações de Jerusalém”, onde Deus compara Jerusalém a uma mulher amada, que na sua juventude era desprezada, mas foi cuidada por Ele, e assim cresceu, ficou bonita, e foi vestida, enfeitada, alimentada, ornamentada, exaltada, e enfim, no auge de sua glória, se voltou para outros “homens”, se deitou com eles, se prostituiu em sua soberba, esqueceu de quem a formou, e se achou capaz de criar imagens de outros “homens” para se entregar, e a eles sacrificou seus filhos e filhas, e encheu-se de abominações, esquecendo-se dos dias de sua juventude “quando estava nua e descoberta, manchada no seu sangue”.

Eu poderia parar por aí, pois os versículos seguintes reafirmaram a mesma ideia, que é o que geralmente procuro entender, onde Jerusalém e seu povo é condenada pela sua infidelidade a Deus, que a formou e a fez especial entre as nações. Mas algo me fez continuar a ler sobre as imoralidades de Jerusalém, e o que Deus faria com ela, para humilhá-la e faze-la se arrepender de seus erros. Até que o texto compara Jerusalém no contexto, a Sodoma, e Samaria, que, diz a passagem, apesar de não seguir os mesmos erros, acabou por se corromper mais que elas, “Em todos seus caminhos”. Isto chamou a minha atenção, e para minha surpresa, veio: “Eis que foi a maldade de Sodoma, tua irmã, soberba, fartura de pão e abundancia de ociosidade teve ela e suas filhas, mas nunca amparou o pobre e o necessitado”. “E se ensoberbeceram e fizeram abominações diante de mim, pelo que eu as tirei dali, vendo eu isto”. Neste momento me toquei que estava lendo Ezequiel, o que me conduziu a compreender, desde a primeira leitura da manhã, a passagem fruto da controvérsia gerada e tratada na revista. Fiquei espantado com os pensamentos que me seguiram.

“Tu pois sofre a tua vergonha, tu que jugastes as tuas irmãs, pelos seus pecados, que fizestes mais abomináveis do que elas”. (Ez 16,52)

Mas muito importante, o capitulo termina assim: “Para que lembres, e te envergonhes, e nunca mais abras a tua boca, por causa da tua vergonha, quando me reconciliar contigo de tudo o que fizeste, diz o senhor Jeová”. Deus queria, e perdoou, Jerusalém.

Qual o verdadeiro pecado, a raiz da reprovação aos homossexuais na Biblia? Porque as abominações de Jerusalém foram ainda maiores que os de Sodoma?.

Tudo tem um propósito. Analisamos o que está escrito, para a realidade de uma época, mas a mensagem precisa se adaptar, sem perder o seu propósito, a realidade de outra época. Há inúmeras orientações na Bíblia que se levássemos ao pé da letra, sem esta adaptação diante de seu propósito, viveríamos completamente diferente, na relação entre esposos, na participação das mulheres na igreja e em muitos outros preceitos.

Assim entende alguns pastores, e padres, dentre eles um que muito respeito e que diz, com a representatividade de ser também psicólogo, algo como, “Se São Paulo tivesse noção do que sabemos hoje sobre o homossexualismo, não falaria, hoje, algumas coisas que falou na época, para a realidade da época”. “Pois sabemos hoje que a homossexualidade não é bem uma opção, mas uma condição de ser”.

A Bíblia sagrada nos orienta um proceder, um jeito de viver, com o objetivo de nos conduzir em comunidade, para a felicidade. E nos repreende aquilo que não conduz ao bem do próximo, ao coletivo, e de nós mesmos. O homossexualismo é visto então como um desvio daquilo que é natural, motivado por um propósito que não vem de Deus, mas da decisão de seguir um caminho próprio, movido pela busca do prazer, fruto da soberba de agir independentemente das orientações de Deus, logo desligados dele. Este certamente era o propósito de São Paulo em suas afirmações. Assim vivam de fato alguns povos da antiguidade, entregues a esbórnia, sem limites, seja em relação a sexualidade, seja no egoísmo, na busca do prazer próprio que cega o homem da sua função de servir, do respeito ao próximo, e a misericórdia. Mas isso é comum, não só ao homossexual entregue a devassidão e a luxuria, mas ao heterossexual entregue a devassidão e a luxuria. A soberba está na raiz desta decisão, e desta prática.

Mas voltando a reportagem, há um trecho que exprime uma questão bem diferente, ao falar de Fátima Regina de Souza, arquiteta e homossexual: “Ela tem a impressão de que as pessoas sempre pensam que o homossexual cristão não fez tudo o que podia para mudar, não buscou a Deus o suficiente.”. “É como se a gente estivesse sempre em falta”, diz ela.

O que ela quer dizer? É que a sua homossexualidade não está na decisão de transgredir, não está na soberba de se achar acima da orientação de Deus e desprezá-lo, mas está na sua condição de ser, a qual ela não pode escapar, ou poderia, com muito sofrimento, contra a sua condição natural. Não podemos cegar a esta perspectiva, correndo o risco de colocarmos a lei acima do seu propósito, e da misericórdia, que é o fundamento perfeito. Isto é o que faziam os Fariseus, na sua interpretação inflexível da lei, apesar de bem intencionados muitas vezes, mas que foram chamados por Jesus de hipócritas. A lei foi feita para o bem das pessoas, para conduzir a comunidade a felicidade, e não a discriminação de quem é diferente, se esta diferença é sua condição de ser.

A repreensão, compreendi, está no proceder, nos desprezos as leis naturais, na infidelidade a Deus, que foi a abominação de Jerusalém, maior que a de Sodoma, na soberba que nos leva a olharmos só para nós mesmos, “mas nunca esforçando a mão do pobre e do necessitado” que é a essência cristã, mas em busca dos prazeres inconsequentes, sejam sexuais ou não, como uma religião que substitui a Deus.

Em toda opção há uma consequência, e sim, há insensatos que são homossexuais, assim como heterossexuais, que vivem de maneira reprovável aos olhos da comunidade cristã, sem preocupação alguma com o próximo, se vai escandaliza-lo ou não, pois o outro não lhe interessa. Se optaram por este caminho não podem se dizer cristãos. O mesmo para os avarentos, desonestos, ou quem vive na soberba do egoísmo. Mas se a homossexualidade é sua condição de ser, e ele a vive com dignidade, em uma vida normal, de relacionamentos verdadeiros, contribuindo para a comunidade, e busca a Deus, acho muito difícil que Jesus reprovasse esse cristão, pois como diz São Paulo, somos chamados pelo Espirito Santo para seguir a Cristo.

O cristão verdadeiro não é aquele que conhece a palavra, ou a lei, em suas virgulas, mas o que a vive em sua misericórdia, e gera frutos de amor

Acolher o irmão, em suas diferenças, é uma grande tarefa, e o nosso maior desafio.

 

 

 

 

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